Toda essa avalanche de bazares e liqüidações me deixou um pouco aflita. Não sei se é simplesmente a necessidade de pelo menos ver tudo o que estão liqüidando ou a oportunidade de fazer um negócio da China mas, fato é que é um pouco aflitivo acompanhar tudo.
É engraçado mas acabo achando que liqüidação é pra gastar um dinheiro que eu não tenho numa coisa que eu não preciso. É diferente sair de casa para passear, não levar carteira, simplesmente para dar uma volta por aí. Outra, bem diferente, é ir ver o bazar do fulano ou a liqüidação daquela loja, pra tentar encontrar uma peça que seria uma “oportunidade”.
O que eu vejo, e muito, é um monte de roupas caras, a maioria delas com pequenos defeitos (que, se você reclamar, ainda tem que encarar uma cara feia). Escrevo isso motivada por uma visita que eu fiz a um bazar de um estilista fa-moSSSSSSÉEEERRRRi-mo e acabei com a cara no chão. Um festival de roupas feias, mal acabadas, com tecidos de péssima qualidade, e CARAS. Sim, era um bazar com vestidos de malha fria xuê custando mais de R$100 (vestidos que no Bom Retiro você compra por R$19,90), camisetas horrorosas, estampas pavorosas e roupas de frio para um inverno escandinavo, incluindo aí blusas de lã e casacos tããããooo pesados que mal dava pra manter a pose.
Havia, claro, pouquíssimas exceções, entre elas um vestido de seda pura por R$135 (com um rasgo na costura e manchas de ferrugem). Nada, absolutamente NADA que justificasse a minha ida. Confesso que fui movida a propaganda e pela fama do tal estilista. Já tinha ido a um bazar dele ano passado e também não tinha comprado nada. Pensei que este ano daria mais sorte, mas só me fez ter a certeza que ano que vem vou me “poupar a fadiga”.
Por isso, fiz essa reflexão: será que precisamos comprar SÓ porque está em liqüidação? Ou pior, só para ter a chande de carregarmos a etiqueta do fulano no avesso de uma roupa horrorosa? Claro que sou super a favor do bom negócio e, ao encontrar uma peça que valha a pena, eu sou a favor da compra. Mas temos que pensar em pelo menos 3 coisas:
- Quantas vezes vou usar isso?
- Estou comprando só porque está em liqüidação? Ou seja, essa peça me chamaria a atenção numa vitrine?
- O preço é REALMENTE de liqüidação? Não se deixe enganar pelos 70% OFF da etiqueta. Pagar R$100 por uma camiseta ou R$300 por um vestidinho de malha que antes chegavam a preços estratosféricos não vale a pena.
Me lembro de uma coisa que o Kenzo disse quando estava aqui no SPFW: “Roupa no Brasil é muito cara. Na Europa, é fácil se vestir bem e ser elegante mesmo com pouca grana”. O que me faz pensar: o povo brasileiro trabalha até o meio do ano só para pagar impostos, ganha mal e ainda tem que pagar uma fortuna por roupas mal feitas, com tecidos de péssima qualidade, que alcançam um valor altíssimo só por causa da fama dos que as desenharam?
Por isso, brechó e trocas são legais. Mas o mais legal mesmo é não jogar fora uma roupa eterna, tipo aquele vestidinho preto que nunca faz feio, aquela bolsa que sua avó usou quando namorava seu avô, ou aquele broche que já passa de geração em geração. Fuçar o guarda-roupa, tentar combinações diferentes, investir em acessórios que mudam a cara da produção, como meias coloridas e cintos.
Marca e fama não são nada. Tenho dó de pessoas que economizam a vida toda (ou pelo menos alguns anos) só pra comprar a bolsa daquela marca, provavelmente feita de couro ou algum produto de origem animal (mas nem vou entrar nesse mérito). Será que sua bolsa vai dizer quem você é? Não é melhor você mesmo dizer quem você é? Senão, outras pessoas podem falar por você, coisas que você talvez até discorde. E algumas pessoas acabam como a foto acima, sem identidade nenhuma, escondidas atrás dos pacotes.
Temos que começar a pensar que marca não é nada e nossa identidade não pode ser definida por outra pessoa. Tudo bem comprar algo que te agrade, com o qual você se identifica, mas só comprar porque é do fulano, desculpe-me, mas é burrice. E há grupos de pessoas que vivem assim, se reproduzem assim, e conduzem um grupo de pessoas que pensa e vive assim. Num mundo de aparências que não dizem nada, apenas propagam um modo de vida materialista e consumista.
Li no site de tendências WGSN que, no futuro, os jovens consumidores de moda serão materialistas, consumistas desenfreados, com muito poder aquisitivo e conhecimento. Parece um futuro sombrio querer agradar a um bando de mimados.
Enquanto isso, será que não podemos resgatar o que já estava guardado lá no fundo do armário, vestir-se com personalidade e nos assumir? É preciso coragem, mas sei que teremos. John Lennon já deu a fórmula do sucesso há 40 anos: “Pense globalmente, aja localmente”.